quinta-feira, 16 de junho de 2011

Nossa Linguagem


                                                                                                           Edegar da Silva (*)


Na última edição do boletim PUCRS Informação, a professora Marisa Magnus Smith (da Faculdade de Letras da PUCRS) escreveu um importante artigo de opinião em que aborda dois temas relacionados à Língua Portuguesa, quais sejam a proibição do uso de vocábulos estrangeiros em documentos oficiais do Rio Grande do Sul e a defesa da fala popular inserida em livro didático feito pelo próprio Ministério da Educação. Na opinião da professora Marisa, nossa língua é historicamente marcada por forte miscigenação. Gestada no encontro do latim romano com os falares celtíberos, ainda na própria Península Ibérica acolheram os falares dos bárbaros e dos árabes. Aqui no Brasil a língua para cá trazida pelos portugueses logo se enriqueceu com os falares de incalculáveis origens indígenas, e com o africanismo que os escravos trouxeram a seguir. No início da colonização a “Língua Geral”, estabelecida para o Brasil, era uma mistura do tupi com o português e deixou de ser o idioma oficial da colônia, para desgosto da intelectualidade, por obra do Marquês de Pombal, em 1758. Ele acusava isso de ser uma maculação do vernáculo sagrado da última flor do Lácio. 

O fato é que a evolução de uma língua ocorre por razões históricas, sociais, culturais, políticas e econômicas e isso explica, segundo a professora Marisa “porque o latim suplantou os falares celtíberos; porque o árabe não se impôs ao galego-português então falado na Península; assim como porque o português suplantou a Língua Geral aqui. “Quem pode mais define e exporta mais, inclusive cultura e linguagem”, defende a professora. Ela complementa ainda: “se tivéssemos inventado o CD, talvez o mundo o conhecesse como Disco Compacto. Mas Bossa Nova é Bossa Nova em todo o mundo, e ninguém se atreve a renominá-la. Quem sabe menos, copia menos!”, diz ela. A referida professora argumenta: “o léxico de uma língua é um inventário sempre em constituição e aberto a enriquecimento permanente como expressão da consciência dos povos e de suas maneiras de sentir o mundo”. Quando , com naturalidade degustamos um ravióli ao pesto acompanhado de um bom Cabernet, seguido de um mousse (esta uma palavra composta por uma deliciosa combinação franco-puniquim) de maracujá, podemos concomitantemente assistir pela tevê a notícia de um tsunami, tudo isso vivenciando um momento da nossa história que bem podemos compreender e nos pode ser bem familiar.

Já, sob outra ótica, é interessante registrar o artigo de Dom Dadeus Grings, Arcebispo Metropolitano de Porto Alegre, publicado no jornal O Sul, edição de 3 de julho último, em que ele registra que “ficamos perplexos ao constatar que se ensina oficialmente erros de linguagem na última flor do Lácio. E pior ainda, vemos nossa língua vilipendiada com estrangeirismos cada vez mais numerosos e agressivos, como a demonstrar uma pobreza endêmica de nossa  língua pátria. Somos invadidos e violentados. Nossa língua é declarada incapaz de expressar a cultura dos nossos meios de comunicação. Vale por isso a reclamação do poeta que proclama nossa língua como a última flor do Lácio, inculta e bela, tão maltratada por seus usuários”. Ele hipoteca solidariedade à iniciativa do deputado Raul Carrion, na Assembléia Legislativa gaúcha, que apresentou projeto de lei depurando a nossa língua de estrangeirismos, mas faz votos de que à semelhança, também proponha medidas que repudiem iniciativas oficiais de ensinar erros de linguagem, assim como erros matemáticos. “desejamos uma língua castiça, expressão genuína da alma brasileira. É por ela que nos relacionamos. Cada um merece receber uma boa comunicação, feita com arte e pureza. A língua constitui um patrimônio a ser preservado, desenvolvido e aprimorado. É o espelho de nossa cultura e de nossa alma brasileira, de nossa convivência e de nosso desenvolvimento. Numa palavra, somos nós mesmos como nação”, enfatiza Dom Dadeus.

“Precisamos com urgência, sem preconceito ou demagogia, capacitar nossos estudantes, especialmente o mais carente de bens culturais, para o pleno domínio dos mecanismos discursivos”, defende Marisa Smith. “Agir livre de preconceitos implica não só em acolher e aceitar as pessoas como são e com o que têm, mas também acreditar que sejam capazes de evoluir por méritos próprios. Aula de língua materna é etapa para construir e consolidar a cidadania e ninguém se torna cidadão por receio do ‘outro ameaçado’, seja ele o que vem de fora ou o que vem de cima. Escola é lugar para estudar e evoluir,” completa a professora, criticando a falta de cuidado na correção de livros pedagógicos pelo próprio MEC.

(*) Jornalista e técnico agrícola

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